COBRANÇA DAS TAXAS EM LOTEAMENTOS FECHADOS

Consiste o loteamento na divisão de terreno urbano em lotes para fins de comercialização e edificação, resultando na abertura de novas ruas ou prolongamento das existentes, com a destinação de áreas públicas ao município para instalação de equipamentos urbanos, comunitários e espaços livres, respeitando os parâmetros restabelecidos pela Lei n.º 6.766/79 e pela legislação municipal aplicável.

Trata-se os loteamentos de acesso controlado, popularmente chamados de loteamentos fechados, de uma espécie do gênero loteamento, caracterizado pelo controle de acesso dos moradores e visitantes, mediante a concessão do direito real de uso ou permissão de uso de bens públicos à associação de proprietários ou ao loteador, para que estes assumam as despesas internas com os serviços públicos, que, para tanto, serão custeadas pelos participantes do negócio jurídico inicial ou aqueles que se filiaram à associação.

As associações de proprietários, necessárias para o funcionamento do loteamento, são disciplinadas pelos artigos 53 e seguintes do Código Civil e pelo artigo 36-A da Lei 6.766/79, incluído pela Lei n.º 13.465/17, Lei de Regularização Fundiária.

O valor cobrado pelas associações a título de rateio para custeio dos serviços fornecidos, a chamada taxa de manutenção, gerou diversas discussões judiciais, seja pela sua natureza pessoal ou real, ou pela constitucionalidade da sua cobrança.

Chamado para se manifestar, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 695.911/SP, fixou a seguinte tese:

É inconstitucional a cobrança, por parte de associação, de taxa de manutenção e conservação de loteamento imobiliário urbano de proprietário não associado até o advento da Lei nº 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão, a partir do qual se torna possível a cotização de proprietários de imóveis, titulares de direitos ou moradores em loteamentos de acesso controlado, desde que: i) já possuidores de lotes, tenham aderido ao ato constitutivo das entidades equiparadas a administradoras de imóveis; ou ii) no caso de novos adquirentes de lotes, o ato constitutivo da obrigação tenha sido registrado no competente registro de imóveis.

Logo, além de determinar um marco temporal, estabeleceu o Tema 492 critérios formais para que passasse a ser possível a cotização dos proprietários de lotes. Passou a ser possível a cobrança das taxas de manutenção dos proprietários, associados ou não, a partir das alterações promovidas pela Lei nº 13.465/17 ou de anterior lei municipal que discipline a questão, desde que fossem observados os seguintes critérios formais:

JÁ SÃO PROPRIETÁRIOS

  • Adesão ao ato constitutivo da associação.

NOVOS PROPRIETÁRIOS

  • Averbação do Estatuto Social no cartório de registro de imóveis competente.

Deve-se não olvidar que a associação expressa é necessária para os loteamentos instituídos antes da validade da Lei de Regularização Fundiária ou de lei municipal específica. É importante analisar a legislação municipal referente ao tema, visto que os municípios poderão editar normas relacionadas ao parcelamento do solo, suplementando a legislação federal e estadual no que couber. Alguns exemplos de legislações municipais, anteriores a 2017, que legitimam a cotização pelas associações, são, por exemplo, a Lei n.º 2.472/1999 do município de Dois Córregos/SP, que prevê:

Artigo 37 – Todo loteamento de chácara de recreio, seja distanciado da zona urbana da cidade de Dois Córregos e da vila de Guarapuã, de forma a não ser inserido no seu sistema viário, obrigatoriamente, será requerido loteamento fechado, na forma disposta nesta lei.
[…]
§1º […]
I – Constituírem uma associação de proprietários dos lotes de chácara de recreio o respectivo loteamento para administrarem o loteamento fechado, obrigando-se a aprovar pelo voto da maioria e assinar o estatuto de sua constituição;
II – Contribuírem para a manutenção das vias e logradouros e espaços livres, com o serviço de distribuição de água potável, distribuição de energia elétrica, iluminação pública e coleta de lixo;

Ou a Lei Complementar nº 100/2015 de Mineiros do Tietê/SP, prevendo que:

Art. 33 – Nos loteamentos denominados “chácaras de lazer”, será constituída a “associação do loteamento”, estabelecida como pessoa jurídica de direito privado, sem finalidade econômica, que representará os proprietários dos lotes do empreendimento e que arcará com todas as despesas e ônus.

Logo, a cobrança das taxas de manutenção é um tema complexo, que até hoje gera divergências no judiciário. Neste sentido:


TAXA DE ASSOCIAÇÃO – AÇÃO DE COBRANÇA (FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA) – Impugnação – Acolhimento e extinção da execução – Inconformismo da associação – Afastamento – Demanda ajuizada originariamente perante a proprietária, falecida após o sentenciamento – Feito que prosseguiu, na fase de cumprimento de sentença, perante o herdeiro – Controvérsia que merece análise à luz do Tema 882 do C.STJ em sistema de recurso repetitivo (REsp 1.439.163/SP) e Tema 492 do C. STF – Superveniência da Lei n. 13.465/2017, que apenas permite a cobrança das taxas após a sua edição, se houver menção na matrícula ou adesão à associação – Requisitos desatendidos, na hipótese – Herdeiro que jamais se associou formalmente à entidade – Pagamentos efetuados que não implicam em adesão tácita – Trânsito em julgado da r. sentença proferida na fase de conhecimento, posterior ao julgamento do Acórdão Paradigma do C. STF – Extinção corretamente decretada – Sentença mantida – Recurso improvido.

Apelação – Loteamento – Associação de moradores – Cobrança de mensalidade de proprietário de lote – Procedência – Insurgência – Observância à tese fixada no Tema nº 492 em sede de Repercussão Geral pelo C. Supremo Tribunal Federal, na ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 695.911/SP – Cobranças posteriores ao advento da Lei nº 13.465/17 – Apelado que pagou taxas até então e que figurou como presidente da associação, pelo que não pode negar a associação – Sentença mantida – Recurso improvido. (TJSP; Ap. 1002281-02.2020.8.26.0198; Des. Rel. Silvério da Silva; j. 11/03/2024)

No corpo do acórdão, a respeito da adesão ao ato constitutivo:


Na situação dos autos, apesar da ré negar que se filiou à associação, verifica-se que o loteamento fechado foi constituído por ela mesma, sendo devidamente registrado em 23/07/2012 (fls. 307/309), e os débitos cobrados referem-se a um período iniciado em maio de 2018. A tese firmada no Recurso Extraordinário nº 695.911, Tema 492, estabeleceu um marco temporal para a cobrança de taxas associativas, qual seja, a partir da edição da Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017. Além do mais, em que pese a alienação do bem imóvel para Bruna Galassi e a associação desta ao condomínio, verifica-se que ocorreu a rescisão contratual, permanecendo a ré na titularidade do bem. Assim, a ré possui responsabilidade pelo débito referente às taxas associativas ante previsão contida em matrícula imobiliária e estatuto social. A ré-apelante tenta desqualificar a cobrança da taxa em contradição à natureza jurídica da cobrança, cuja exigência, como proprietária, lhe é aplicável.

Situações mais complexas ainda surgiram após a suposta pacificação do tema, vide o RE Nº 1.569.609 – SP, na relatoria da ministra Nancy Andrighi:

RECURSO ESPECIAL. REEXAME. ART. 1040, II, CPC/2015. TEMA 492/STF. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO. LOTEAMENTO. PAGAMENTO DE TAXA DE MANUTENÇÃO. PREVISÃO EM CONTRATO-PADRÃO SUBMETIDO A REGISTRO IMOBILIÁRIO. CLÁUSULA QUE AUTORIZA A COBRANÇA DAS DESPESAS ADMINISTRATIVAS PELO LOTEADOR. ANUÊNCIA EXPRESSA COM A OBRIGAÇÃO DE PAGAR. DISTINÇÃO COM O RE 695.911/SP. 1. Ação declaratória de inexistência de obrigação ajuizada em 10/02/2009, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 05/06/2014 e atribuído ao gabinete em 25/08/2016. 2. O propósito recursal é dizer sobre a validade da cobrança de contribuição vinculada à prestação de serviços de manutenção, realizada pela administradora do loteamento em que situados os imóveis dos recorrentes. 3. O registro da incorporação se perfaz em contrato de adesão, nos termos do art. 39 da Lei n.º 6.766/79, assim a obrigação não pode ser impugnada por quem anuiu à associação, que, por força da concordância expressa com a estipulação contratual, é exigível a partir do momento em que a pessoa se torna proprietária. 4. Na hipótese de multa prevista em contrato em caso de inadimplemento, a cláusula possui validade, tendo em vista a anuência do adquirente. 5. Recurso especial não provido.

Por fim, em que pese a discussão ainda ser incipiente, observa-se a formação de uma jurisprudência em prol da cobrança das taxas de manutenção, desde que observados os critérios elencados pela lei e pelas decisões dos tribunais superiores. A jurisprudência tem caminhado para a viabilidade da cobrança, desde que respeitados os limites e a forma estabelecida pela legislação.

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